Para além da materialidade
Pessoas que se consideram brancas devem usar adereços representativos da cultura negra? Muito se ouve protesto em relação a pessoas brancas que usam coisas que “são” de pessoas negras. Um desses conflitos é o uso do turbante. Com base nisso, me perguntei até onde vão esses conflitos e qual a fundamentação dos argumentos usados.
Obs: fique claro que não aprofundarei nessas questões e seus diversos argumentos. Quero apenas mostrar uma forma de ver esses conflitos, uma forma de entender esses questionamentos.
O que eu posso usar? O que eu devo usar? Essas são duas perguntas completamente diferentes. Nós temos, por lei, o direito de ir e vir, ou seja, temos liberdade para fazer o que quisermos. Em contrapartida, existe uma lei moral que rege nossas ações. Ou seja, eu posso fazer, vestir, usar o que eu quiser, mas, moralmente, devo fazer isso? Essa questão aparece sempre em nosso convívio social bem como na situação em questão não é diferente.
Se uma pessoa de pele clara usa um turbante (ou semi), provavelmente poderá caminhar e fazer suas coisas normalmente. Muito pouco provavelmente que vai atrair alguma atenção diferente para si, talvez alguns olhares julgadores.
Se uma pessoa negra usa um turbante, provavelmente ela vai atrair olhares curiosos com um toque de admiração ou estranheza. Ela terá seu dia normal, mas cercada por olhares atentos ao que está em seu cabelo.
Podemos perceber uma diferença entre os quadros expostos acima. Duas pessoas que estão na mesma situação, qual é a diferença entre elas? Sinceramente, vai pra muito além da cor pele, essa diferença está para além da materialidade. O que difere ambas as situações é a significância, a relação de reconhecimento entre o individuo e o objeto.
Para o primeiro caso, o turbante é só mais um adereço de embelezamento. Não denota nenhum significado aparente. Porém, para o segundo, o uso desse adereço é muito mais do que apenas para ficar bela. Percebi que nos dias hodiernos, o turbante é utilizado como forma de representação de uma história e de uma cultura e, até mesmo, uma forma de resistência. Praticamente todas as coisas questionadas pelos militantes e não militantes negros é justamente isso: não se questiona o uso do objeto em si, mas a intencionalidade do uso e o significado que existe por trás dele.
Como eu disse inicialmente, todo mundo tem o direito de fazer o que quiser e quando quiser. Isso é direito seu, e não abra mão disso jamais. No entanto, existem coisas que para você pode não significar nada, mas para muitas pessoas é muito importante. Então, eu acredito que para essas situações de significados e representações distintas, o que vale é olhar para si mesmo, mas é também olhar para o outro. Não um olhar de ignorância, mas de sensibilidade e compreensão. É, acima de tudo, se colocar no lugar do outro.
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