LIMBO MATINAL

 LIMBO MATINAL

Kathléen Carneiro


Já faz alguns minutos que Joana está apoiada na soleira da porta sem fazer qualquer movimento ou som. Olhando para dentro da cozinha, ela observa cada movimento do homem à sua frente. Ele já lavou as louças que estavam na pia – não eram muitas, mas o suficiente para que Joana ficasse com preguiça de limpar –, depois de pegar as embalagens e restos de comida que estavam sobre o balcão e jogar no lixo, mexia na geladeira. Com as sobrancelhas arqueadas, pressionou a mão na perna e sentiu uma pontada de dor em um dos pontos da coxa. 

Ter um homem limpando sua casa não era um problema, pelo contrário, talvez fosse o sonho de qualquer mulher. Ainda mais quando se mora sozinha, parece que todos os móveis e objetos ganham vida, já que nada mais fica no lugar ou se limpa sozinho. É questão de tempo até que uma casa arrumada se torne uma vítima do furacão Katrina. O que Joana não entendia era o porquê daquela beldade estar em sua cozinha. Depois de beliscar seu próprio braço e sentir a dor do aperto, percebeu que sim, havia um homem na sua cozinha, e muito bonito afinal. Se fosse um assassino, seria uma ótima companhia para morrer. 

Apoiando a mão na nuca, sentia a dor de cabeça que começava a surgir. Havia exagerado demais na noite anterior. A ideia era ir para um bar com seus amigos, não beber e extravasar toda a energia e estresse da semana. Buscando flashes dos últimos acontecimentos, Joana piscava e tentava se concentrar em suas memórias, mas aquele homem vestido apenas com uma bermuda de moletom tirava toda a sua atenção. Apesar do rosto familiar – tudo bem, não tão familiar assim -, flashes de memória começam a saltar em sua mente. Ela dançava com suas amigas. Luzes coloridas piscando por toda boate. Um homem gostoso encarando ela do bar. Ela chega em casa ao tropeços tentando acender a luz. Tinha alguém segurando sua cintura. Ela caindo da cama completamente nua e batendo a coxa na quina da cama. Caiu em cima de alguém. Eles riem sem parar, se beijam e riem de novo.

- MERDA! - gritou.

O homem que estava levando a garrafa de leite até a boca olha para a porta com os olhos arregalados. Joana empalidece e permanece parada até decidir o que fazer. Em questão de segundos, caminha em direção ao cara com um sorriso brotando no rosto ao mesmo tempo em que coloca a garrafa sobre a pia. Ele observa os passos dela olhando em seus olhos. Joana para em sua frente, pega a garrafa de leite e diz:

- Não bebe direto do bico, vai estragar. - virando em direção a porta, carrega o leite indo para o quarto deixando o homem no mesmo lugar que o encontrou, na geladeira.


#KC<3


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