BOSSA NOVA: um tributo a todos os amores não vividos – parte III

 


ALÉM DE MIM
Kathléen Carneiro

Bip! Bip! Bip!

Ele pegou o celular e abriu a mensagem:

Número desconhecido: Olá Luiz, tudo bem? Meu nome é Cristina e a minha irmã me passou o seu contato. Eu estudo na mesma universidade que você e gostaria de algumas dicas sobre o curso. Acho que esse contato pode ser importante para a gente se ajudar durante esse processo dos estudos. Ela me falou que você também está enfrentando uns desafios né? Quando tiver um tempo pra conversar, me avisa. Beijos!

 Luiz leu a mensagem e pensou no que responder. Estava a dias na correria dos estudos, não saia de casa para nada, até porque a pandemia não permitia. Sua rotina se resumia a estudos a distância (contra sua vontade), cozinhar pra não morrer de fome e receber visita da namorada sempre que dava, isso inclusive a tornava a pessoa que ele mais via durante todo o período de isolamento social. Ele a amava mais do que tudo. Alguns anos atrás, o encontro deles aconteceu de maneira tão inesperada que se lembra da sensação de não querer deixar a oportunidade de estar com ela todos os dias passar. Desde então, nunca mais se desgrudaram. Se viam sempre que possível, eram cúmplices, confidentes, amigos e amantes. Ele não teria sobrevivido aos últimos acontecimentos sem ela.

Nos últimos meses, Luiz sofreu de uma exaustão emocional por causa de cobranças no trabalho, nos estudos e da família. Sentia-se sufocado, ansioso, cansado demais para ser forte. Foi quando, mais do que necessário, decidiu se isolar (apoiado por um lockdown mundial). Desligou-se das redes sociais, evitava o contato com os amigos e colegas, buscava paz. Por tempo demais, sua namorada era sinônimo de paz, até não ser mais. Nesse caso, a ironia por trás da verdade é que o problema era ele e não ela. Ele precisava ficar alguns dias sozinho, desconectado de tudo e de todos para se reencontrar. Perdido no caos dos últimos acontecimentos no Brasil e no Mundo, o sentimento era de deslocamento na sua própria casa, um intruso na sua própria mente, um estranho em seu próprio corpo.

Dia ou outro acordava de bom humor, animado o suficiente para responder sua família e amigos avisando que seu coração continuava batendo a todo vapor. Queria fazer mais, mas nada era tudo o que conseguia ser naquele momento. Quando acordava com ânimo, ia para a cozinha depois de arrumar casa, cozinhava acompanhado da sua namorada e se dedicava a série ou o livro que estava vendo/lendo. Aproveitava a inspiração para se dedicar aos seus trabalhos pendentes. O exílio lhe pareceu confortável até sentir que já era hora de voltar a enfrentar a vida. Isso porque um novo semestre da faculdade se iniciaria em breve e tinha um projeto para terminar. Quando a mensagem chegou, foi como um sinal de que era hora de retomar sua vida tal como fosse possível. Portanto, ainda um pouco relutante, pegou o celular, apertou o ícone do microfone e começou a gravar um áudio.


                                     Continuação na próxima semana, dia 01 de abril de 2022.

#KC<3

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